Curiosidades
O Despertar
Qual a reação dos seus pais quando descobriram que você era bruxa?
Há uma frase muito significativa dita por Gardner que representa bem esse chamado ou "despertar" de um bruxo: "Uma vez bruxa, sempre bruxa!", essa frase retrata que quem nasceu para ser, será, não tem escapatória, quem sabe fazer, faz. Quando era menor, infelizmente não sei qual minha idade nesse período, minha avó ganhou uma imagem de uma santa e me deu, minha mãe nunca gostou de imagens e quando eu disse a ela sobre o que minha avó paterna havia me dado, ela foi totalmente contra, disse que se eu quisesse realmente tê-la por perto, eu a teria quando morasse sozinha ou quando tivesse um quarto só pra mim. Devido a isso, não tive muito contato com a imagem da santa, minha avó concordou em guardá-la em seu quarto e quando eu tivesse meu "espaço", eu poderia levá-la, e assim foi. Quando pequena fui à igreja em torno de quatro ou cinco vezes, sem ser exata, casamento e culto, nunca fui obrigada à ir, mas era sempre aquela pressãozinha de "vamos na igreja!", então eu fui, contra a minha vontade, mas fui. Nos casamentos, me sentia desconfortável, nunca gostei de casamentos, gente fazendo votos e uma demora horrível e agoniante, todo mundo no silêncio mais profundo possível... Já os cultos, uma explosão de sentimentos, gritos, euforia, choro e alguns até se jogavam no chão aos prantos gritando "amém" ou "aleluia", e eu sempre me senti mal. Era um lugar em que eu não fazia parte, aquilo tudo me assustava. Eu nunca gostei de ver gente chorar, porque eu não sentia o mesmo, nunca gostei de gente gritando ao meu lado aos prantos sem que fosse para pedir algo realmente significativo e no final das contas, para quem eles pediam? O que eles gritavam? Eu não sabia, ninguém nunca me disse o motivo de tudo aquilo. Já um pouco maior, eu me negava a ir, e dessa forma, não me levavam mais. A primeira vez que vi uma loja esotérica, eu tinha cerca de oito ou nove anos de idade — se não um pouco menos —, e tudo aquilo me fascinou! Eram pedras, o cheiro do incenso que nunca se sabia de que lado vinha, as mandalas penduradas, os espelhos, os duendes e fadas, tudo! Eu queria tudo!
Meus avós maternos são muito religiosos, então querem influenciar todos os filhos à ir para a igreja, em final de ano tem oração familiar e todas essas coisas das quais eu sempre fugi, até mesmo hoje, aos vinte e um anos de idade. Duas das filhas deles são religiosas, mas não praticantes assim como a minha mãe, então nunca passaram por lojas esotéricas ou lojas de umbanda batendo os pés e fazendo a cruz, essas minhas duas tias até curtiam e ainda curtem muito sobre espiritualidade, coisas esotéricas. Meus avós sempre quando chegavam na casa de algumas delas e via algo fora do comum, já apontava o dedo com reprovação dizendo que era "macumba" e eu por muito tempo convivi com esse tipo de polaridade a "macumba esotérica" e Jesus Cristo Único. Nada daquilo me despertou interesse de fato, era tudo uma fase de observação, de testes, que aguçar as coisas e instigar e nada além disso. Com a entrada na adolescência, me afastei da minha santinha, da qual embora não soubesse motivos ou qualquer coisa a respeito, sentia apreço, e com a adolescência entrei em um momento meu, de descobertas e de provações, tudo o que estava a minha volta mudou em diversos aspectos, meio familiar, distanciamento de parentes, vontades e habilidades e tudo foi se construindo às pressas, então posso dizer que foi um período conturbado. Aos 12 para 13 anos de idade eu comecei a ter contato com a religião wicca, professoras de inglês que adoram halloween e seus trabalhos sobre esse tema e imagens do google que me fascinaram de imediato. Durante esse período conheci pessoas que temiam a wicca, pessoas que se diziam praticantes e que nada sabiam de fato, encontrei pessoas curiosas a entender o que era aquele mundo e principalmente uma pessoa dentro de mim mesma que sabia o que era tudo aquilo, e é como a frase no primeiro parágrafo diz, uma vez bruxa, sempre bruxa!
Comecei a estudar a religião, comecei a investigar e com ela vieram os medos, eu tinha medo de tudo, de músicas diferentes, imagens, fechar os olhos em meditação e todas as coisas mais simples. Em um dia, já entendendo bem mais do assunto resolvi fazer um ritual para falar com 7 saias, porque amigo tinha contato, porque amigas queriam se envolver e eu sabia como fazer um ritual e cinco pessoas entraram em um ritual que eu comandei e que de início me deixou sem dormir por algum tempo, mas que hoje faz muito sentido. Passamos em torno de cinco horas cada um em uma ponta de um pentagrama traçado no chão feito com sal grosso, em um quarto escuro com velas e incenso, suamos em bicas, muitas revelações e muitas sensações, era o começo de alguma coisa. Embora eu acreditasse entender tudo, não entendia nada, nenhum círculo, nenhum real cuidado, nenhum objetivo maior e uma ideia de menina que acha que as coisas "escuras" são interessantes. Depois desse episódio, me entretive mais nas práticas e nos meus estudos, e encontrei duas pessoas que foram essenciais na minha jornada, uma delas é Aline Pandora do Espiral das Bacantes e a outra é a L., trocamos contatos, conversamos, elas me forneceram alguns textos, vídeos e principalmente sessões de "tira dúvidas". Como moravam longe, nunca tive contato com qualquer pessoa dentro da bruxaria, menos ainda com covens. No início tive vontade em entrar em um grupo para aprender e fazer, porque tudo era muito difícil.
Quando cheguei com a história de altar, minha mãe estranhou, nunca teve contato com nada a respeito e não entendia nada sobre o assunto, também não teve interesse em perguntar ou mesmo em entender, deixou que eu fizesse o que eu queria fazer. Ela nunca torceu o nariz, nunca foi contra, mas sempre avisou que se aquilo incomodasse, como fulano disse que aconteceria, ela me mandaria tirá-lo. As pessoas tem a mania de pensar que você não cresce, então é tudo fase "isso passa!", quando não fazem piadinhas ou mandam indiretas. Já sofri muito por discordar dos outros e as pessoas não entenderem, já bati boca, já parei de falar com alguns, já enfrentei... E hoje vejo que de nada adianta bater de frente, e se rolar piadinha, deixa entrar por um ouvido e sair por outro! Com o caminho, aprende-se a tolerância, a exercer a sua espiritualidade e alcançar a tranquilidade de não se incomodar com provocações desse tipo, mas também a exata identidade em colocar sua ideia a prova e ser firme com suas escolhas e vontades, isso tudo no final das contas é um crescer.
Fiz minha auto dedicação, segui os costumes de 1 ano e 1 dia, o tempo passou e eu não vi ele passar. Me dediquei ao máximo, trouxe as vivências, me interessei por mais coisas, todos os meus conceitos mudaram e justamente por todas essas mudanças eu também mudei. Eu não tinha muita espiritualidade, não conseguia ver os Deuses porque todo Deus masculino ao qual qualquer cultura se referia, eu só tinha a imagem de Jesus Cristo na cabeça, eu tive que me treinar, tive que colocar imagens no altar, tive que estudar sobre um Deus específico para ter a imagem dele e as coisas foram se formando, cada um dos Deuses, hoje, possuem suas reais formas sem que eu tenha de tirar a imagem de outro da cabeça e esse é o processo mais complicado dentro da prática, você se adaptar. Eu tive vontade ter voz, ensinar (mesmo não sabendo nada), vontade estar em grupos, vontade fazer cadeiras e mesas saírem do lugar com uma só palavra como qualquer neófito tem. Fiz todas as celebrações à risca, montei meu altar, fui atrás e nesse tempo sou o que sou.
Hoje, aos vinte e um, não me digo bruxa wiccaniana ou wiccana (ambos os termos corretos), já que não faço parte de quaisquer fins religiosos, possuo uma crença e sou bruxa solitária, minhas regras, minhas vontades e meu acordo com os Antigos, com nove anos de prática, auto-dedicada e futura sacerdotisa, até que Eles me digam o contrário. Hoje meus medos são outros, o entendimento é mais profundo, as mensagens chegam mais facilmente e eu me tornei uma pessoa mais espiritualizada, essa minha espiritualidade foi boa porque embora eu tenha uma personalidade complicadíssima, eu me tornei mais humana, mais acessível, entendi mais sobre compaixão, entendi sobre meu feminino e o leque se abriu de diversas formas, fui ganhando as chaves das portas dos mundos. É engraçado que algumas pessoas se assustem: "Nossa! 9 anos!" ou "Nossa, 12 anos", mas acreditem, tudo passa tão depressa, que parecem dias, eu particularmente costumo brincar e dizer "são nove dias de prática, nove dias que me entendo por bruxa!", porque realmente é muito pouco, nunca saberemos de tudo, a vida é um eterno aprendizado e será sempre uma abertura para novos entendimentos, estamos em constante mudança e precisamos acompanhar essas mudanças para não ficarmos para trás. Ser bruxo é estudar seriamente, é dedicar-se à tudo o que se propor a fazer ou conhecer, é ousar instigar-se, ousar realizar o que tem vontade e não ter medo, porque os caminhos são escuros, mas as bênçãos vem em forma de luz! Quando se é, simplesmente é. As coisas tendem a acontecer naturalmente e mesmo que naturalmente, você precisa estar atento(a) aos sinais, às mensagens, às visitas... Tudo o que acontece tem motivo, se não um, dois ou três, mas sempre tem! Cada um de nós tem nossas experiências e cada um de nós vai lidar com uma situação específica, mas em geral, acontecem sempre da mesma forma, um despertar, um renascer, uma mudança, porque a bruxaria é isso, mudar-se, entender-se, entender o outro e espiritualizar o que você é.